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Comissão Episcopal para a Ação Sociotransformadora
Comissão Especial para o Enfrentamento ao Tráfico Humano
Comissão Especial para a Ecologia Integral e Mineração
Foto: Cláudia Pereira | Articulação das Pastorais do Campo
Foto: Cláudia Pereira | Articulação das Pastorais do Campo

Por Carlos Henrique Silva | Comunicação CPT Nacional

Presidente da Comissão Pastoral da Terra (CPT) desde abril de 2021 e integrante da Comissão Episcopal para Ação Sociotransformadora da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (Cepast-CNBB), Dom José Ionilton Lisboa de Oliveira avalia o ano que se encerrou e as perspectivas para o país, a Igreja e a CPT, além de sua mudança, a sair da Prelazia de Itacoatiara (AM), para a Prelazia do Marajó (PA).

 

Confira a entrevista

Qual avaliação podemos ter do cenário do país, no ano que se encerrou?

Eu diria que nós vivemos, hoje, um cenário melhor do que quando encerramos 2022. O governo que assumiu em janeiro tem sinalizado para uma mudança em determinadas áreas de atuação, retomando as chamadas ‘comissões de escuta do povo’, retirando alguns projetos danosos, como a facilitação da posse de armas e de munição; criando o Ministério dos Povos Indígenas; retornando um Ministério do Meio Ambiente que realmente cuida do meio ambiente; e um Ministério de Direitos Humanos e Cidadania com o rosto verdadeiramente de direitos humanos.

Contudo, sabemos que o governo prometeu, por exemplo, desmatamento zero, e eu acho que nesse sentido ainda tem que avançar mais. Pode ser que haja a intenção, mas esse governo, eleito por uma força ampla política, tem enfrentado muita dificuldade com um Congresso ultraconservador. As causas que nós defendemos – e até diria que o governo também defende – têm encontrado muita resistência, como é o caso do Marco Temporal dos povos indígenas, da aprovação dos agrotóxicos e de uma lentidão no processo da Reforma Agrária.

Creio que 2023 foi um ano para aprimorar e manter o que vínhamos querendo e lutando, e 2024 se abre como sinal de que temos que lutar mesmo. Ou seja, não se conquista direitos esperando de braços cruzados o que o Governo ou o Congresso Nacional possa nos oferecer.

E em relação à Igreja brasileira?

No que diz respeito à Igreja, este também foi um ano de mudança na Coordenação Nacional e na presidência da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Aí, foi essa fase de adaptação, com alguns sinais bons, algumas manifestações bem claras, como a crítica à derrubada dos vetos do presidente à questão do Marco Temporal, mas também momentos em que houve uma certa demora para se manifestar. Espero que a CNBB possa dar passos mais firmes, inclusive fazendo com que cada organismo e comissão que trabalha determinado tema possa ter esse espaço maior para se manifestar de forma urgente.

Sobre a CPT, qual sentimento deve estar presente neste ano em que se inicia a caminhada rumo ao jubileu de 50 anos?

Então, acho que nós, enquanto CPT, também devemos continuar na luta, para que a gente consiga ajudar o nosso povo — camponeses, ribeirinhos, quilombolas, pescadores, indígenas… — a terem seus direitos respeitados, a permanecerem em suas terras e, também, a conquistarem sua terra.

Nosso trabalho e nossa missão é ao lado do povo e suas lutas, ajudando a se organizarem. A gente espera que neste ano possamos avançar neste serviço, fortalecer os grupos de base, articular melhor cada regional e as articulações que nós temos. Que tudo seja em vista deste objetivo maior, de apoiar o povo trabalhador do campo a ali viver, ali permanecer e, também, a conquistar sua terra sonhada, a partir da reforma agrária.

Na nossa assembleia, que vamos realizar em abril, vamos avaliar os três anos de caminhada e planejar os próximos três anos, incluindo a celebração dos 50 anos de criação da nossa CPT. Isto com certeza vai nos fortalecer neste compromisso com os pobres da terra. Inicialmente trabalhando com os camponeses, depois, a CPT foi trabalhando com os povos indígenas — onde o Cimi [Conselho Indigenista Missionário] ainda não chega —, junto aos pescadores — onde o CPP [Conselho Pastoral dos Pescadores] ainda não chega —, e com todas as pessoas que trabalham no campo. Nossa perspectiva é esta: fortalecermos nosso trabalho e compromisso de defesa, ao lado das comunidades, não fazendo no lugar delas, mas acompanhando e contribuindo para fazer acontecer a conquista dos seus direitos.

O ano de 2023 foi muito marcado pelo agravamento dos efeitos das mudanças climáticas, com destaque para a seca enfrentada na Amazônia, região de sua atuação mais direta.

De fato, nós enfrentamos as consequências da crise climática, especialmente aqui na Amazônia, onde eu vivo e trabalho, mas também em outros lugares do Brasil, com secas e enchentes. Foi um alerta e um grito da natureza, que esperamos que tenha sido escutado por todas as pessoas, pelos governantes, igrejas e por todos os homens e mulheres de boa vontade, independentemente de ter ou não uma prática religiosa.

Como é possível olhar com esperança para uma realidade tão desanimadora de empreendimentos danosos ao meio ambiente e à vida?

Devemos manter, sim, esse olhar de esperança, porque ele nos faz agir e acreditar que é possível uma transformação, também no nosso cuidado com a Casa Comum, na continuidade da nossa luta em defesa dos nossos biomas. É manter essa esperança para dizer que ainda podemos, com a nossa participação, com a nossa luta, continuar enfrentando esses projetos danosos para a natureza, como são os projetos de exploração de petróleo e gás.

Vamos precisar, em 2024, continuar sendo uma voz para dizer ‘Não’ à exploração do petróleo na foz do Amazonas. Precisamos continuar mobilizando as pessoas para dizer que não dá para continuar o desmatamento, seja na Amazônia, no Cerrado, na Caatinga, nos Pampas ou na Mata Atlântica. Se a gente continuar desmatando como fizemos nestes últimos anos, corremos um sério risco de ter um aumento da temperatura, de um grau tal, que a vida na Terra pode ficar insuportável.

Mas temos que manter essa esperança, porque se nós, que somos da luta e compreendemos a defesa da Casa Comum, que defendemos a floresta em pé, se a gente parar e desanimar, aí é que as coisas se complicam. Vamos ter que continuar na luta, fazendo este trabalho de conscientização ecológica e defesa dos nossos biomas e dos nossos povos, e de tudo aquilo que ajuda o mundo a ter mais vida, inclusive denunciando, também, tudo aquilo que traz consequências para a crise climática crescer ainda mais.

Após seis anos à frente da Prelazia de Itacoatiara (AM), o senhor está sendo transferido para a região do Marajó (PA). Como estão as expectativas diante deste novo desafio?

A expectativa é que vou continuar na Amazônia, praticamente fazendo a mesma missão, porque a realidade é semelhante. Temos que continuar na mesma luta em defesa desse bioma, junto dos mais empobrecidos, na defesa dos diretos humanos, no combate ao trabalho escravo, no enfrentamento ao tráfico de pessoas e à exploração sexual de crianças, adolescentes e jovens, na conquista da reforma agrária, e pra fazer com que a nossa fé cristã católica ajude a transformar tudo aquilo que é anti-vida na sociedade. Apenas vou mudar de área territorial, mas a missão vai continuar. É assim que eu penso e desejo, quando chegar lá, pisar no chão, ouvir bastante quem já vive ali, e ver como eu posso contribuir a partir da minha vida e da minha experiência.

Estou indo como alguém que quer somar, alguém que quer continuar a realizar a missão de Jesus: em defesa do bem, da verdade, da pessoa humana e da nossa Casa Comum, como tem pedido a própria Igreja, através da insistência do papa Francisco. Além da igreja local, também estarei junto ao Regional Norte 2, que inclui os estados do Amapá e Pará.

Que mensagem o senhor poderia transmitir para a equipe de agentes da CPT e as comunidades e povos acompanhados?

Quero dizer a todos os nossos agentes, nos regionais, nas grandes regiões, nos grupos de base, que a missão é nossa, e a missão continua sendo de cada um e cada uma de nós. A CPT é uma organização eclesial social, para prestar um serviço junto dos camponeses, para ser força de comunhão, apoio e solidariedade, na defesa da terra, das águas, dos territórios, da natureza e dos povos. Eu desejo a cada agente da nossa CPT muita sabedoria, muita proteção de Deus e muita coragem para fazer a nossa missão acontecer.

Que tenhamos uma boa assembleia no mês de abril, onde estaremos em avaliação e planejamento, fazendo eleição da diretoria, da Coordenação Nacional e do Conselho Fiscal. Vamos fazer com que, em cada lugar onde estejamos, a gente possa contribuir para o bem do nosso povo, ajudar nosso povo a ter vida, a estar protegido, a conquistar o que lhe é de direito. Que o nosso povo e comunidades do campo tenham condições de ter acesso à terra e a cultivá-la.

O caminho também é fazer incidência política, em cada base, nos municípios e regiões, e em nível nacional, principalmente neste Congresso que é tão resistente aos direitos dos homens e das mulheres do campo. E que continuemos mantendo a nossa campanha de enfrentamento à violência no campo, que é a nossa grande meta a partir da assembleia de 2021, que começou com iniciativa da CPT, se ampliou com outras forças vivas e hoje é construída junto com outras pastorais, organismos e movimentos. Dando-nos as mãos, seremos mais fortes e, com certeza, seremos capazes de denunciar todas as violências e contribuir para que as causas dessas violências cessem e, assim, os trabalhadores e trabalhadoras do campo possam viver em paz.

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