Marx afirmou, em tempos idos, que a “religião é o ópio do povo” — ou seja, um anestésico diante do sofrimento e da dor, capaz de criar um mundo paradoxal e irreal. Paradoxalmente, parece que essa afirmação tem se concretizado em algumas expressões religiosas que se distanciam das instituições tradicionais e, ao mesmo tempo, criam novas formas cuja lógica econômica é justificada por conceitos da teologia da prosperidade. Essa lógica leva a um mundo surreal que, paulatinamente, se transforma em uma suposta verdade e passa a influenciar a vida concreta das pessoas.
Esse fenômeno pseudorreligioso alimenta e justifica uma versão moderna e sofisticada de uma guerra silenciosa, porém violenta, que se alastra nas ações cotidianas do Estado e de suas instituições. Essa guerra se manifesta por meio de uma lavagem cerebral em massa, atingindo agentes públicos com o entorpecente manipulador da mídia e das redes sociais, através da propagação de notícias falsas travestidas de verdades absolutas — sempre com um tom salvacionista, moralista e legalista.
Esse processo, aliado a diferentes fundamentalismos, atinge os grupos mais vulneráveis: as periferias urbanas e existenciais. Entre elas, destaca-se o sistema penitenciário, onde a religião se transforma muitas vezes em moeda de troca, mercantilizando o ser humano e sujeitando-o a exigências e falsas conversões. Utilizam-se meios de som centralizados, rádios de conteúdo religioso e outras formas que negam, dificultam ou até hostilizam a verdadeira assistência religiosa — aquela baseada na escuta atenta da realidade pessoal e individual, capaz de despertar responsabilidade e gerar autêntica transformação pessoal e social abrindo caminhos por um mundo “sem prisões”.
O Papa Bento XVI, muitas vezes idolatrado e instrumentalizado, mas raramente escutado, afirmava com clareza: a Igreja não faz proselitismo; a fé cresce por atração, pelo testemunho. Por isso, mais do que nos apegarmos a fórmulas ou regras que transformam a fé em uma espécie de droga — como são muitos eventos de massa que aglomeram e apagam nossa identidade —, é necessário assumir a responsabilidade de um discipulado cujo modelo é Jesus de Nazaré. Nele e por Ele, a fé gera frutos de transformação humano-social: esse é o verdadeiro Evangelho da vida plena.
Oxalá possamos voltar a ser profetas de novos céus e de uma nova terra — nossa casa comum —, para o bem viver de todos. 

Este artigo foi editorial da Rede de Notícias da Amazônia em 25 de junho de 2025.

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