Este artigo foi originalmente publicado na Revista Cristo Rei da Diocese de Toledo – PR, e compartilhado com alegria à Comissão Episcopal para Ação Sociotransformadora, da CNBB. Nele abordamos um tema bastante sensível e necessário: a realidade dos vícios em Jogos e Apostas. Pedimos aos amigos leitores lerem com calma, atenção e cuidado, se você está passando por uma situação de dependências seja qual for, ou você que está aprendendo a acompanhar alguém neste processo de reabilitação, estamos juntos! Vamos aqui dar algumas pistas de como ajudar a encontrar caminhos, evitar atalhos perigosos e compreender alguns comportamentos humanos que nos auxiliarão a lidar com este tema.
O diálogo sobre este tema é fundamental em nossas famílias e comunidades, pois ele pode estar mais presente em nossas realidades do que costumamos imaginar. Questione-se agora: você conhece alguém que joga ou jogou no “tigrinho” ou nas “bets esportivas”? Acreditamos que a maioria respondeu “sim” à essa pergunta. Os dados confirmam essa situação. Se observamos por exemplo, pesquisas realizadas pela BigDataCorp, empresa de datatech, o número de empresas de apostas online no Brasil saltou entre 2021 a 2024, com um crescimento de 153%, de 840 para 2,1 mil. Há ainda outros dados mais alarmantes: o Raio-X do investidor brasileiro, estudo realizado pela Anbima, divulgado no fim de maio, mostrou que 23 milhões de brasileiros apostaram em 2024 (15% da população). Esses números superam os dos investidores, acendeu um sinal de alerta para esse comportamento.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) reconhece o vício em jogos de azar como uma condição patológica, denominada ludomania. Esta situação caracteriza-se por uma condição mental em que um indivíduo possui um desejo incontrolável de jogar mesmo sabendo que este comportamento traz consequências negativas para a sua vida e dos que convivem com ela. Mesmo que pareça inofensiva, a “ludomania” é uma dependência comportamental que se assemelha ao abuso de substâncias como o cigarro ou o álcool por exemplo. Todo esse cenário, revela dados preocupantes e expõe situações complicadas decorrentes desses comportamentos de apostas na população brasileira. Hoje vemos muitas pessoas e famílias afetadas pelos “triginhos” e “bets” que vendem promessas de diversão associadas ao ganho financeiro, mas na verdade acabam gerando ou potencializando problemas diversos. Quando pensamos na saúde, vemos problemas como a ansiedade, a depressão, podendo chegar até à ideação suicida em alguns casos. No campo das finanças vemos que o vício em jogos podem gerar ou aumentar o endividamento das famílias, a perca do património construído ao longo de uma vida ou até mesmo comportamentos ilegais de furtos ou fraudes para sustentar o vício. Todas essas situações podem afetar as relações familiares e profissionais.
Mas, porque mesmo sabendo de tantas consequências negativas, as pessoas apostam e realizam jogos de “azar”? Muitos são os motivos que podem levar alguém a desenvolver o vício em nesse tipo de jogos. Por exemplo, a paixão que temos pelo futebol associada a possibilidade de obter algum lucro. São os ingredientes perfeitos. Há também o efeito manada, não queremos nos sentir de fora, parece que todos estão jogando e ganhando (este é um detalhe, ninguém conta o que perdeu). Aqui também aparece como motivador um componente psicológico conhecido como víés do otimismo, “ah, eu entendo de futebol e conheço meu time, então tenho muita chance de ganhar”. Soma-se a isso situações extremas em que alguém ao passar por um período de dificuldade financeira como um caso de doença na família, ou até mesmo um processo de endividamento pode se desesperar para conseguir ‘algum dinheiro’ e acabar arriscando a sorte nesses jogos.
A falta de uma educação financeira para a vida também pode contribuir para esse cenário, tendo em vista que, por falta de compreensão sobre esses temas ainda há pessoas que acreditam que os jogos de azar assemelham-se e devem ser tratados como investimentos. E isso não é real. Os rendimentos dos investimentos são baseados em fatores diversos como juros, inflação, setor de autação, câmbio e outros índices econômicos e de mercado. Enquanto esses jogos são baseados em estatísticas manipuladas para que uma grande maioria de pessoas perca dinheiro para gerar lucro para as empresas internacionais que gerenciam essas plataformas de apostas. Vale destacar que toda ‘fofurice’ do “tigrinho”, a interatividade dos aplicativos das bets, com suas luzes, brilhos e estímulos diversos são construídos sob arquiteturas pscicologicas que favorecem o desenvolvimento de dependencia e vício. Sendo assim, todo e qualquer tipo de jogo e aposta não são investimentos.
Por isso, o trabalho de educação financeira é fundamental. Juntamente com a pressão política contra o projeto de Lei 442/1991 que tramita no Senado Federal, para legalização e regulamentação de jogos de azar no Brasil. A Igreja Católica é contra pois conhece os males e perigos que deles provêm. Destacamos aqui a fala do Papa Francisco: “Fico muito triste ao ver partidas de futebol e estrelas do esporte promovendo plataformas de apostas, isso não é um jogo; é um vício (…) desespero e os suicídios causados pelo fato de que em cada casa há um cassino através do celular”. Vale a pena conhecer a nota oficial da CNBB sobre este assunto e o trabalho da Pastoral da Sobriedade. Lembrem-se sempre: Educação Financeira é Educação para a Vida!
Ana Carolina Alves: Mestre em Economia e Educadora Financeira
Augusto Martins: Mestrando em Teologia