Série "Pssica" imagem divulgação/Netflix

 

23 de setembro, Dia Internacional contra a Exploração Sexual e o Tráfico de Mulheres e Meninas. A data, mais do que um marco no calendário, é um convite à reflexão sobre uma das formas mais cruéis de violação de direitos humanos, que permanece invisível para grande parte da sociedade. Nesse contexto, a série “Pssica”, dirigida por Quico Meirelles, exibida pela Netflix, ganha ainda mais relevância. A trama não se limita à ficção: ela expõe, com a força da arte e da cultura amazônica, as dinâmicas de exploração e a violência que ainda marcam o cotidiano de muitas comunidades.
A série, que adapta a obra de Edyr Augusto, mergulha em uma análise profunda e dolorosa do tráfico de pessoas e da exploração sexual, utilizando como cenário o Norte do Brasil, uma realidade que, no entanto, é global. O título, uma gíria do Pará para “maldição” ou “azar”, já estabelece o tom sombrio da história.
A narrativa acompanha dramas familiares atravessados por disputas de poder, desaparecimentos e o sequestro de meninas por redes de exploração. Um dos pontos fortes da produção é a caracterização: os atores trazem com fidelidade rostos, sotaques e modos de vida do Norte, conferindo autenticidade ímpar à obra.
A série destaca o sequestro como um dos componentes ligados ao tráfico humano. Contudo, é importante ressaltar que o engano, por meio de falsas promessas de emprego, estudo ou relacionamentos, é o método mais comum para atrair vítimas, especialmente mulheres e adolescentes em situação de vulnerabilidade. A corrupção também é um pilar da série, mostrando como a conivência institucional sustenta a impunidade dos exploradores e silencia comunidades inteiras. A produção ainda relaciona a exploração sexual a crimes socioambientais, como garimpo ilegal e exploração de madeira. A série infelizmente, imita a vida.

 

A narrativa segue a vida de três personagens interligados, abordando o ciclo de violência. A personagem Janalice, por exemplo, se torna vítima de exploração, e sua situação é agravada pela incompreensão dos pais, que a expõem ao perigo por uma interpretação  equivocada de sua fé. A série mostra que muitos aliciadores e aliciadoras também são vítimas, perpetuando o ciclo do crime. Em um dos episódios, o sequestro de Janalice se concretiza, e a jovem é mantida em cativeiro, revelando um submundo do crime organizado em que até os próprios criminosos são enganados.
“agora esse teu corpo não te pertence”
A frase dita por um dos aliciadores, “agora esse teu corpo não te pertence” , resume a desumanização das vítimas, cujos corpos são leiloados em um mercado cruel. Infelizmente, essa autenticidade também expõe uma ferida real. O arco narrativo que se passa em Caiena, onde meninas são aliciadas e desaparecem na cidade, não é apenas um recurso dramático: ele dialoga com relatos verídicos.
Concordamos com a mensagem final da série. Se há algo que pode romper esse ciclo, é a sororidade. O apoio entre mulheres, seja na denúncia, no acolhimento ou na reintegração de vítimas, é a chama que resiste à escuridão imposta pelo tráfico. Ao final, Pssica não é apenas ficção; é um espelho incômodo que nos obriga a refletir sobre como a violência se infiltra em territórios abandonados pelo Estado e sobre a urgência de respostas coletivas que coloquem a vida e a dignidade acima de qualquer interesse.
A obra expõe uma realidade perturbadora e a forma como a vulnerabilidade social, a corrupção e a exploração se entrelaçam.
A série de quatro episódios é  uma adaptação do  de Edyr Augusto e está disponível na plataforma Netflix.

 

 

*Graziella Rocha é diretora da Asbrad, membro da membro da Comissão Episcopal Especial de Enfrentamento ao Tráfico Humano (CEETH-CNBB)  e cinéfila.

*Cláudia Pereira é  Jornalista e comunicadora da Comissão Episcopal Especial de Enfrentamento ao Tráfico Humano (CEETH-CNBB)

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