Assembleia Nacional do Conselho Pastoral dos Pescadores inicia com análises de conjuntura da política nacional e eclesial
Por Assessoria de Comunicação do CPP
Fotos: Henrique Cavalheiro/CPP
Iniciou-se em 26/02 em Olinda–PE a Assembleia Nacional do Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP), que continuará até 1º de março. O encontro tem como tema “Memória, projeto e segmento na ótica da Sinodalidade na Ação Pastoral do CPP”, com o lema “Deus, ao contemplar toda a sua obra, considerou-a ótima” (Gn 1,31). Participantes dos 8 regionais do CPP estão reunidos para analisar a situação política nacional e internacional, e também para avaliar e planejar as ações pastorais para o ano de 2024.
No encontro ainda será feita uma homenagem a importantes nomes que colaboraram para a fundação e consolidação do trabalho do CPP ao longo dos 55 anos de existência da pastoral. Uma missa fará memória do fundador da pastoral dos pescadores, Frei Alfredo Schnuettgen, do ex-secretário executivo, Bernardo Siry, e do ex-presidente do CPP, D. José Haring, ofm.

Assembleia iniciou com uma análise de conjuntura feita pela assistente social representante da Coletiva Mahin de Mulheres Negras, Tânia Palma, seguida por Cristiane Faustino, da Instituição Terramar e por Ormezita Barbosa, agente de pastoral do CPP Ceará/Piauí.
Tânia Palma fez uma análise de conjuntura que rememorou os processos de opressão que acontecem desde a colonização. “O que se importou de Portugal até aqui foi um projeto de devastação. Havia um projeto de dominação do colonizador e até hoje lutamos para fazer resistência a isso”, explica Tânia.
Para a assistente social, o processo de apropriação do capital aumentou após a redemocratização do país. “O governo FHC revestiu uma capa sofisticada de dominação. Trouxe um novo modelo de expansão comercial e de apropriação dos bens coletivos, com a roupagem de democrático e com o discurso de redução do estado”, analisa.
Tânia, no entanto, aponta também que o enfrentamento a esse processo é feito a partir da solidariedade. “O projeto do capitalismo é dividir a classe trabalhadora e fazer com que a gente não se junte. Temos que olhar para as comunidades com um olhar de amor. Isso o sistema não derruba. Esse é o nosso modelo de solidariedade que ninguém tira de nós. O nosso horizonte é melhorar a sociedade, construir o paraíso na terra. A nossa briga contra o capital está sendo feita desde 1500, não vamos correr dessa briga”.
Já Cristiane Faustino fez uma análise sobre as influências das políticas do norte global no sul global e a mudança de valores que o capitalismo trouxe para a sociedade. “Atualmente há um contexto muito complexo. A expansão do capitalismo vem com a expansão de valores, como o individualismo”, explica.
Cristiane também refletiu sobre as narrativas que tratam das guerras internacionais na mídia brasileira e o impacto delas nos conflitos enfrentados pelas comunidades. “A grande mídia ao invés de aprofundar as questões relacionadas às violências enfrentadas pelas crianças e mulheres palestinas, faz o discurso dos prejuízos que a fala de Lula causou”, analisa a palestrante fazendo referência às críticas que o presidente fez contra o governo de Israel por conta do etnocídio dos palestinos.
“As narrativas sobre essas guerras são um desafio para nós dos movimentos populares, porque têm impacto nas nossas vidas. A guerra da Ucrânia está impactando na expansão das usinas eólicas lá nas comunidades do Ceará, porque a Alemanha pressiona para a produção de hidrogênio verde aqui no Brasil. A relação entre norte e sul global, faz com que os interesses dos capitalistas do norte global, fluam para as disputas territoriais no sul do globo”, reflete.
Cristiane defende que a conquista de direitos trouxe como consequência o aumento da extrema-direita. “As mulheres e a população negra avançaram no ponto de vista dos direitos e por isso há uma reação a esse processo, com o crescimento da extrema-direita e da violência contra os corpos”, aponta. “A nossa força acumulativa de narrativas é extremamente potente e extremamente enriquecedora. E por isso a fala dos oprimidos assusta e é geradora de muitos conflitos, inclusive nos seios das lutas sociais”, finaliza.
Já Ormezita Barbosa fez um panorama sobre o contexto das políticas públicas para a pesca artesanal. “As políticas de ordenamento estão centradas nas espécies de grande valor comercial. A gente não consegue viabilizar uma política concreta para a pesca continental, por exemplo” analisa. Ormezita também demonstra preocupação com as políticas para as mudanças climáticas. “Houve o agravamento das mudanças climáticas e há a inexistência de medidas e políticas que pensem a partir das origens das mudanças climáticas. Temos que pensar políticas que não fiquem restritas a distribuição de auxílios emergenciais”, pontua.
Análise de conjuntura eclesial
Durante a tarde foi a vez da análise de conjuntura eclesial que contou com a participação, de maneira remota, de Roberto Malvezzi, membro da Comissão Especial de Ecologia Integral da CNBB e do diácono Francisco Adilson, do Serviço de Assistência Rural.
Roberto Malvezzi analisou a Igreja a partir das reflexões do Papa Francisco nos documentos recentes lançados no seu pontificado. “O Papa Francisco tem insistido que a gente está atravessando uma mudança de época. Significa que as mudanças que estamos vivendo no mundo são radicais”, aponta. “O Papa indica 4 mudanças cruciais. A primeira mudança, foi a mudança tecnológica. A mudança da internet, das tecnologias chegaram de forma profunda em todas as comunidades. O Papa Francisco nos desafia a usar essas ferramentas para o bem, para comunicar as lutas”, explica.
Malvezzi ainda explica que outro ponto de mudança radical indicado pelo Papa é a questão ambiental. “A Terra está mudando. Os oceanos não estão dando conta de absorverem todo o gás carbônico. Morrem os corais, mudam os oceanos, os rios e também há a apropriação dos territórios”.

A terceira mudança acontece no mundo sócio-político. “Os valores da sociedade liberal, pegaram de cheio a Igreja. A sociedade se tornou muito mais individual e a própria liturgia ganha uma conotação individualista no próprio jeito de cantar e falar”, analisa.
Em meio a todas essas mudanças, Malvezzi defende a manutenção da metodologia das pastorais sociais. “A metodologia da Teologia da Libertação é querermos que o povo se organize, seja sujeito da sua história para conseguir a sua emancipação. Nós não podemos renunciar a essa metodologia de ter proximidade com o povo. Promover o trabalho de organização e conscientização”, defende. “Nessa mudança de época, com essa mudança profunda na religiosidade do povo brasileiro, não podemos perder o rumo, a nossa metodologia, mas devemos aproveitar as novidades no mundo da técnica para dar continuidade às nossas ações”.
O diácono Adilson fala em seguida, dando prosseguimento a análise sobre as mudanças recentes na Igreja Católica. O diácono aponta as dificuldades para dar prosseguimento às reformas propostas pelo Concílio Vaticano II (CV II), ainda na década de 60. “As pastorais sociais tentam manter a todo custo aquilo construído dentro do Concílio Vaticano II, que é aquilo que rege a Igreja hoje. O Papa tem falado que o Concílio definiu essa Igreja para o mundo de hoje. Nós não conseguimos colocar em prática, ainda, as diretrizes e as orientações pastorais do CV II. Nós que estamos militando no trabalho de base e nas pastorais sociais precisamos intensificar o trabalho de formação”.
