Lançamento do Painel de Dados sobre Tráfico de Pessoas e do Relatório Nacional sobre Tráfico de Pessoas: Dados 2024/Foto:Isaac Amorim/MJSP
Ministério da Justiça lança painel de dados inédito e revela que exploração laboral supera a sexual. Migrantes e vítimas aliciadas pela internet são focos de preocupação

 

Por Cláudia Pereira| Cepast-CNBB

 

O tráfico de pessoas para fins de trabalho análogo à escravidão continua sendo a principal modalidade desse crime no Brasil, superando a exploração sexual. A constatação é do “Relatório Nacional sobre Tráfico de Pessoas: Dados de 2024”, lançado nesta sexta-feira (4) pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) em Brasília. Para ampliar a transparência e o acesso às informações, o governo também apresentou um painel de dados interativo e inédito sobre o tema.

 

O levantamento, que consolida dados de diversos órgãos federais, aponta que 41% dos inquéritos instaurados pela Polícia Federal (PF) em 2024 investigaram crimes de trabalho escravo, enquanto 32% estavam relacionados à exploração sexual. As iniciativas marcam o início das ações do mês de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, tendo como  Dia mundial de conscientização  30 de julho.

 

Perfil das vítimas e novas fronteiras do crime
O relatório detalha que o perfil das vítimas varia conforme a finalidade da exploração. Há uma predominância de homens, majoritariamente pretos e pardos, nos casos de trabalho escravo, principalmente nos setores da construção civil, agronegócio, indústria têxtil e trabalho doméstico. Já as mulheres são as principais vítimas da exploração sexual.
A internet  se consolida como uma das ferramentas principais  dos criminosos para o aliciamento. Neste caso mais da metade dos casos utilizados para a exploração sexual. Além de atrair, a rede é usada para controlar e explorar as vítimas remotamente.
A vulnerabilidade de migrantes continua alta. Sul-americanos, especialmente paraguaios e bolivianos, figuram entre os mais atingidos. O relatório destaca ainda um aumento de vítimas asiáticas, como os 163 trabalhadores chineses resgatados na maior operação da PF no ano passado. Fora do Brasil, o tráfico tem alimentado plataformas de apostas em países asiáticos, como as Filipinas.

 

Avanços na repressão e o desafio da subnotificação
Apesar da gravidade do cenário, o documento aponta avanços institucionais. O número de operações da Polícia Federal cresceu 82% em 2024, e o total de inquéritos abertos subiu de 103 para 149 no mesmo período. A articulação entre os órgãos também melhorou, resultando em um aumento de 2.350% no número de notificações de vítimas brasileiras no exterior.
Mas a subnotificação permanece como um dos maiores desafios, o que significa que os dados oficiais podem representar apenas uma fração da realidade. Dados do Disque 100, por exemplo, mostram que nos últimos oito anos foram registradas 857 denúncias anônimas, com o estado de São Paulo concentrando a maioria dos casos (280).

Painel Interativo: Uma Nova Ferramenta de Monitoramento
A  inovação apresentada pelo MJSP é o painel interativo de Power BI, uma ferramenta de acesso público que reúne, pela primeira vez, dados de diferentes fontes governamentais. Desenvolvido pela Secretaria Nacional de Justiça (Senajus), o painel atende a uma prioridade do IV Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (PNETP).
Marina Sampaio, coordenadora-geral de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, ao apresentar o  painel,  destacou que o objetivo do instrumento é oferecer transparência e facilitar o acesso a informações qualificadas sobre o tráfico de pessoas, combatendo a fragmentação e subnotificação de dados. A iniciativa busca centralizar informações de diferentes instituições de forma organizada, possibilitando inferências e estratégias para o enfrentamento. O objetivo é apoiar a formulação de políticas públicas baseadas em evidências, tornar o fenômeno mais visível e engajar a sociedade na luta contra o tráfico, incluindo a visualização de tendências e perfis associados a essa questão.
“A proposta é evidenciar tendências, lacunas e pontos de articulação institucional. É ter uma base mais qualificada para o planejamento e avaliação de políticas públicas”, afirmou Marina Sampaio.

 

A consultora Natália Figueiredo ao apresentar o relatório apontou que  as instituições ainda enfrentam desafios na coleta de dados, mas estão melhorando de forma gradual em seus processos. A troca de informações entre órgãos, como o CNJ e a DPU, tem se tornado mais eficaz, o que contribui para uma análise mais profunda e comparativa.