Fotos: Omar Montenegro
Encontro de bispos latino-americanos analisam os impactos da mineração contra a vida e a natureza

 

Por Padre Dário Bossi

 

 

A rede ecumênica continental “Igrejas e Mineração” e as Pastorais Sociais – Cáritas do Panamá realizaram na Cidade do Panamá, de 7 a 10 de outubro de 2024, o encontro de bispos da América Latina que vivem em regiões impactadas pela mineração.
O encontro, organizado com o apoio da Conferência Episcopal do Panamá e com a presença de seu presidente, secretário e do arcebispo da capital do país, reuniu outros 13 bispos, entre eles um cardeal, provenientes da Guatemala, Colômbia, Peru, Argentina e Brasil. Participaram também dois representantes do Vaticano, do Dicastério para o Desenvolvimento Humano Integral. O Brasil foi representado por Dom Vicente Ferreira e Pe. Dário Bossi, presidente e assessor da Comissão para Ecologia Integral e Mineração da CNBB, além de Dom Luiz Fernando Lisboa, arcebispo de Cachoeiro de Itapemirim (ES), que participou por conexão online.
O evento foi promovido a partir de pedidos de apoio e assessoria de bispos que atuam em regiões de conflitos provocados pelo extrativismo predatório em diversas partes do continente. Trata-se de um modelo econômico que devasta e aniquila outras propostas de vida das comunidades em seus territórios, e que os bispos do Conselho Episcopal Latino-Americano definiram como “uma desenfreada tendência do sistema em transformar os bens da natureza em capital”.

 

 

Encontro reuniu religiosos na Cidade do Panamá, entre os dias 7 a 10 de outubro de 2024, para refletir os impactos da mineração. Foto: Omar Montenegro

 

Na hora de defender seus territórios, as comunidades indígenas estão dispostas a dar a vida; precisamos ficar ao lado delas”
O principal objetivo do encontro foi fortalecer relações fraternas, de acolhida e apoio recíproco entre pastores que sofrem na própria pele as feridas provocadas por sua coerência ética e compromisso profético.
“Como posso negar a aliança com as comunidades camponesas que acompanho, quando elas pedem apoio nas denúncias e reivindicações junto às empresas mineradoras e ao Estado? Com que coragem, depois, iria até elas celebrar ou pregar o Evangelho, se fosse omisso quando mais precisaram?”, comentou Mons. Ochogavía, secretário-geral da Conferência Episcopal do Panamá.
“Na hora de defender seus territórios, as comunidades indígenas estão dispostas a dar a vida; precisamos ficar ao lado delas”, reforçou o Cardeal Ramazzini, manifestando sua indignação com as violações provocadas por uma empresa canadense de extração de ouro, na Mina Marlin, na Guatemala.
Os bispos partilharam comoventes histórias de vida e resistência e manifestaram o rosto profético e samaritano da Igreja, que escuta o grito dos pobres e da Mãe Terra, e se coloca como solidária e aliada na reivindicação por direitos e justiça ambiental.
Mons. Jenry Ruiz, bispo da diocese de Trujillo, em Honduras, celebrou o luto e a luta de sua comunidade, recordando a vida de Juan López, ministro da Palavra e seu amigo, brutalmente assassinado, provavelmente a mando dos poderosos que defendem a instalação de uma mina no território sagrado da montanha do departamento de Colón. Pelo menos dois dos bispos presentes no encontro receberam ameaças de morte e tiveram que viver sob proteção policial. O número de lideranças ameaçadas, criminalizadas, processadas ou mortas no continente, por defenderem seus territórios e comunidades contra a ganância da mineração e outros grandes projetos, continua crescendo.
Para defender a instalação destes projetos, as empresas e o Estado frequentemente procuram a Igreja, esperando encontrar disposição para mediar os conflitos. No entanto, os bispos foram muito claros ao reafirmar que o papel da Igreja, em situações de desproporção de poder, não é ser neutra, mas manter a opção preferencial pelos pobres: uma escolha de campo, a partir da qual é possível dialogar sem trair as expectativas e esperanças das comunidades.
“Ainda lembro o dia em que representantes da empresa me visitaram”, comentou Dom Noel Londoño, bispo de Jericó, Colômbia. “Em determinado momento, eles ofereceram construir para nossa diocese uma ‘catedral de cobre’, como símbolo de uma aliança entre a Igreja e a mineradora. Sem dizer nada, levantei-me, abri a porta e agradeci a visita. Nunca mais voltaram”.
Outro objetivo do encontro foi, a partir da escuta recíproca, discernir novos caminhos para a promoção da Ecologia Integral diante da mineração. A rede Igrejas e Mineração apresentou formas pelas quais pode se colocar a serviço das comunidades de fé, de seus projetos de vida e de seus territórios. Destacaram-se iniciativas de incidência política (como a promoção de um tratado vinculante para as empresas em relação aos direitos humanos; empenho pela ratificação do Acordo de Escazú, o mais importante tratado socioambiental em nível continental; estudos e ações sobre as transições minero-energéticas; participação no processo do Fórum Social Temático sobre mineração, entre outras). Também foram abordados a Campanha de Desinvestimento financeiro na mineração e o grupo de trabalho da rede sobre Ecoespiritualidade.

 

 “Voltamos a nossos territórios com a renovada paixão de Jesus e o sonho de Deus, que é um Reino de justiça e paz, no qual todas as pessoas e toda a criação tenham a oportunidade de vida plena”

 

Apesar de manifestarem sua fragilidade e, às vezes, sentimentos de impotência frente a projetos tão poderosos, os bispos perceberam que o encontro foi um tempo oportuno, um kairós, para renovar o compromisso evangélico de cuidado com a Casa Comum. Eles escreveram uma carta fraterna ao Papa Francisco, pedindo apoio e garantindo oração e plena comunhão.
Dom Vicente Ferreira compartilhou sua dramática experiência ao lado das famílias de Brumadinho (MG), vítimas do crime ambiental cometido pela empresa Vale, no desastre da barragem que resultou na morte de 272 pessoas. “Saímos deste encontro sentindo o apoio dos irmãos bispos, do Celam e do Vaticano. Voltamos a nossos territórios com a renovada paixão de Jesus e o sonho de Deus, que é um Reino de justiça e paz, no qual todas as pessoas e toda a criação tenham a oportunidade de vida plena”, concluiu Dom Vicente.

 

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