Que restou do sonho?
Um punhado de anciãos guerreiros e guerreiras,
doentes uns, encurvados e cansados outros,
apoiados em suas companheiras bengalas;
não poucos abatidos, sem forças e sonolentos,
já na passagem do outono para o inverno;
pressentem o sonho se partir aos pedaços,
se fragmentar, dispersar, dividir e pulverizar,
escorregando sem remédio por entre os dedos!…
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Que restou do sonho?
Uma multidão de adultos e adultas
que sonhou e lutou junto com seus pais;
mas, com o passar do tempo e das energias,
vendo o horizonte se distanciar e se apagar,
se desiludiu e se irritou, mudando de rumo,
descobriu novas veredas, trilhas e atalhos
onde os desejos se tocam com o olhar e a mão!…
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Que restou do sonho?
Jovens de uma geração autocentrada,
cujas metas concentram-se no “aqui e agora”;
impedidos de olhar mais ao largo e ao longe,
aturdidos pela surdez e pela cegueira
provocadas pelo apelo e o fulgor do marketing,
aliados à propaganda estridente do mercado;
aprenderam a sonhar o fugaz imediato,
sem o peso e a tarefa de elaborar projetos futuros!…
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Que restou do sonho?
Milhões de crianças órfãs de pais vivos,
filhas submissas e a tempo pleno das telinhas;
perdidas, umas pela riqueza outras pela pobreza,
tateando e manipulando brinquedos exóticos,
de forma particular armas e jogos de matar,
sem olhos nem ouvidos para os ruídos de casa e da cidade,
ao mesmo tempo vítimas e algozes do bullying e da violência!…
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Mas há também outras que, às dezenas, centenas e milhares,
fazem perguntas que os pais são incapazes de responder,
as quais, endereçando sua curiosidade infantil
para o mundo que as cerca, desvendam novos conhecimentos,
buscam lições para além da escola, da rua e do exército,
e que podem, sim, ser as protagonistas e artífices
do sonho dos avós, perdido e reencontrado pelo caminho;
trazem de volta o oxigênio vital da primavera,
pois cada geração produz seus vilões e parasitas,
mas produz igualmente seus heróis e guerreiros!…
Pe. Alfredo J. Gonçalves, cs, Assessor do SPM – São Paulo, 8 de maio de 2024